A ARTE DE ESCREVER 6 – Dicas ao escrever para crianças e para jovens

O universo das obras destinadas ao público infantil e ao público juvenil cresceu exponencialmente no Brasil dos anos 1980 aos nossos dias. Nossos autores ganharam renome no país e no exterior. Nas pegadas de Monteiro Lobato, que revolucionou a linguagem da literatura para crianças e para jovens com as aventuras inesquecíveis dos heróis do Sítio do Pica-Pau Amarelo, autores como Ziraldo, Lygia Bojunga, Wander Piroli, Ruth Rocha e muitos outros transformaram o texto voltado para crianças e o texto voltado para adolescentes. No mesmo diapasão, as editoras produziram obras diferenciadas no tratamento gráfico, promoveram traduções, adaptaram clássicos e lançaram obras inicialmente escritas sem tal intenção em coleções voltadas para as mais distintas faixas etárias iniciais.

Assim como houve esse boom editorial, houve crescimento nos estudos acadêmicos voltados para essa produção, deslindando procedimentos narrativos e poéticos, e análise dos diferentes modos pelos quais a nova produção se diferenciava da produção anterior voltada para a leitura de crianças e de jovens, assim como aquela voltada explicitamente para leitura escolar.

Trazemos, abaixo, de autores e de estudiosos da literatura para crianças e da literatura para jovens, frases modelares publicadas no Brasil nos últimos anos.

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O Coelho Branco pôs os óculos. “Por onde devo começar, Majestade?”, perguntou ele.
“Comece pelo começo”, disse o Rei muito seriamente, “e continue até chegar ao fim; então, pare.”

Lewis Carroll
Alice no País das Maravilhas

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Não proponho soluções, que não compete à literatura solucionar. Apenas pretendo apontar a sujeira.

Alciene Ribeiro

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Quando as maiorias começam a virar uma avassaladora uniformidade de pensamento, tenho um especial prazer em imaginar como aquilo poderia ser diferente. Tenho plena consciência de que poucas vezes me enriqueci tanto intelectualmente quanto nas ocasiões em que ouvi pessoas com quem não concordava ou que abordavam questões a partir de ângulos que nunca me haviam ocorrido, iluminando-as com novas luzes. Se eu me limitasse a deixar que a correnteza me levasse, acabaria acorrentada a ideias recebidas. Assim, aos poucos fui-me convencendo de que para ser contra a corrente, a gente passa pelo processo de pensar contra o corrente e experimenta divagar por algumas considerações que se afastam do corriqueiro.

Ana Maria Machado

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Para escrever bem, é preciso escrever com honestidade, no sentido emocional. Revelar o mais íntimo, sem ocultamento. […] Não dá para escrever realmente uma obra literária significativa sem mergulhar em verdades pessoais dolorosas e sem se arriscar a descobrir segredos profundos em si mesmo. Sem autenticidade emocional não se faz uma criação literária digna desse nome.

Ana Maria Machado
Contracorrente: conversas sobre leitura e política

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Outra das virtudes desse que passou a ser considerado, com o tempo, “poeta das crianças”, é ter Andersen adotado o ponto de vista infantil, para contar suas histórias. Assim é que, nelas, todos os seres ─ plantas, animais, objetos ─ têm vida própria, como se o maravilhoso fosse a atmosfera natural em que tudo acontece. Entretanto, por ser, ao mesmo tempo, uma literatura baseada em experiências vividas ─ e Andersen teve uma existência infeliz ─ sua obra, de modo geral, é marcada por uma indisfarçável melancolia.

Angela Leite de Souza
Contos de Fada: Grimm e a literatura oral no Brasil

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Evidentemente, tudo é uma literatura só. A dificuldade está em delimitar o que se considera como especialmente do âmbito infantil. São as crianças, na verdade, que o delimitam com sua preferência. […] Não haveria, pois, uma literatura infantil a priori, mas a posteriori.

Cecília Meireles
Problemas da Literatura Infantil

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As crianças nunca chegam à escola num estado de ignorância, mas podem chegar analfabetas. Elas talvez não saiam analfabetas, mas podem sair ignorantes.

Ezequiel Theodoro da Silva
O Ato de Ler: fundamentos psicológicos
para uma nova pedagogia da leitura

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O leitor, seja ele a criança que inicia na alfabetização ou o adulto já na universidade, está em um contínuo de atribuição de significados, de expectativa de visão e de chegar à idealidade daquilo que está sendo mostrado pela cartilha ou pelos diferentes tipos de texto.

Joel Martins
comentando a obra O Ato de Ler: fundamentos
psicológicos para uma nova pedagogia da
leitura, de Ezequiel Theodoro da Silva

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Sem chance, portanto, de receitas literárias, leitor metódico! Nem prescrições, nem proscrições. Toda e qualquer palavra, toda e qualquer construção linguística pode figurar no texto e literalizá-lo. Ou, ao contrário, não literalizá-lo coisa nenhuma, apesar de todo o pedigree literário que certas palavras e construções parecem arrastar atrás de si.

Marisa Lajolo
Literatura: leitores & leitura

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O que esperar então do ensino da literatura? À primeira vista, que ele faculte […] a difusão do saber, como modo de expandi-lo e democratizá-lo. No entanto, quando se produz a retirada de cena da literatura, sobretudo porque tornada passagem para a aprendizagem de um outro que não ela […], o que efetivamente se alcança é seu desconhecimento, impedindo-se, pois, sua democratização.

Regina Zilberman
A Leitura e o Ensino da Literatura

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Um bom livro é aquele que agrada, não importando se foi escrito para crianças ou adultos, homens ou mulheres, brasileiros ou estrangeiros. E ao livro que agrada se costuma voltar, lendo-o de novo, no todo ou em parte, retornando de preferência àqueles trechos que provocaram prazer particular.
Com a literatura para crianças não é diferente: livros lidos na infância permanecem na memória do adolescente e do adulto, responsáveis que foram por bons momentos aos quais as pessoas não cansam de regressar.
[…]
Centenária, a literatura infantil brasileira oferta ao leitor atual um acervo respeitável de boas obras, para serem lembradas por adeptos de várias gerações.

Regina Zilberman
Como e por que ler A Literatura Infantil Brasileira

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Atraiu-nos a aproximação entre escritores que exploraram o estágio da infância: alguns, sob a ótica da criança, mantendo coerência do ponto de vista narrativo e da linguagem, com a realidade evocada; outros, não conseguindo filtrar a matéria da infância através de uma visão “com” ou de “dentro”, assumiram postura distanciada, artificial, ao trazerem a história da infância de forma pouco lúdica e mágica.
Com isso, pretendemos voltar àquela consideração que fizemos anteriormente, quando afirmamos que a complexidade de um texto está não na matéria de que o escritor se valha, mas no como a lê, numa atitude de evocação e transformação que a escritura pressupõe. […] Certos escritores são naturalmente propensos à reconciliação da atitude do escritor, que é sempre um jogador, com a da criança que, em geral, vive um estado de fantasia.

Vânia Maria Resende
O Menino na Literatura Brasileira

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O famoso aedo estava cantando para eles, que o escutavam em silêncio. […] A sensata Penélope […] falou, então, em pranto, ao divino aedo:
─ Fêmio, conheces muitos outros cantares para enlevar os mortais, façanhas de homens e deuses, que os aedos tornam famosas. Canta-lhes um desses, aí sentado, enquanto bebem calados o seu vinho, e deixa esse cantar doloroso, que sempre me rói no peito o coração, […].
Volveu-lhe, então, o ajuizado Telêmaco:
─ Minha mãe, por que reprovas o leal aedo que nos distrai como lhe dita o coração? A culpa não cabe aos aedos, mas decerto a Zeus, que aos homens estrênuos dá conforme lhe apraz. Nenhum mal vai em que ele cante o triste destino dos dânaos; os homens tanto mais aplaudem um cantar quanto mais novo lhes chega aos ouvidos. Que teu coração e tua alma suportem melhor escutá-lo; […].

Homero
Telemaquia, Canto I,
Odisseia 

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Helás, que sem a literatura nossas crianças tem pouca chance de se tornarem adultas na expressão plena do que significa ser adulto.

Rauer Ribeiro Rodrigues
Professor; escritor; em travessia

Informação importante: O Prof. Rauer ministrou, há alguns anos, na pós-graduação de Letras / Estudos Literários do Câmpus de Três Lagoas da UFMS, um Curso de Escrita Criativa; a nosso pedido, alguns dos textos que serviram de diretriz para as aulas, aqui comentados pelo professor, serão replicados no Blog da Editora Pangeia ao longo das próximas semanas e meses. Além dos textos que então utilizou no curso, o professor incluirá outros, ampliando o escopo do curso para um público além dos estudantes universitários. Não perca! Vale a pena acompanhar. (Rízio Macedo Rodrigues, Editor, Editora Pangeia).

 

TEXTOS ANTERIORES DESTA SÉRIE
Como publicar seu livro:
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Aula 1: “A arte de escrever 1 – As oito lições de Isaac Babel”:
https://editorapangeia.com.br/a-arte-de-escrever-1-as-oito-licoes-de-isaac-babel/ >.
Aula 2: “A arte de escrever 2 – Os segredos da ficção, segundo Raimundo Carrero”:
https://editorapangeia.com.br/a-arte-de-escrever-2-os-segredos-da-ficcao-segundo-raimundo-carrero/ >.
Aula 3: “A arte de escrever 3 – Evite verbos de pensamento”:
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Aula 4: “A arte de escrever 4 – Dicas de 15 escritoras”:
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Aula 5: “A arte de escrever 5 – 29 aforismos sobre o microconto”:
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A ARTE DE ESCREVER – links descritivos de todos os artigos da série.

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