Laços e Avessos, o quarto livro da poeta carioca-mineira Flávia de Queiroz Lima, será lançado em pré-venda em abril, constando no selo Edições Dionysius, da Pangeia Editorial. O lançamento, em noite festiva, será no dia 26 de maio na Academia Mineira de Letras, em Belo Horizonte.
Trazemos, abaixo, uma apresentação da poeta, com a leitura dos seus três primeiros livros, lançados espaçadamente nos últimos quatro decênios.
A DENSA POÉTICA DE FLÁVIA DE QUEIROZ LIMA
Rauer Ribeiro Rodrigues
Professor de Literatura
Escritor, em travessia
Poeta em que a exiguidade da produção contrasta com a densa vertigem da reflexão poética e existencial presente em cada um dos seus livros, Flávia de Queiroz Lima nos entrega – em sua nova obra, Laços e Avessos – poemas fortes, que desvelam o humano nos seus afetos de carinho e nos seus avessos e desafetos, com o que entremostram a psiquê atormentada de seres angustiados, tendo por substrato o transcurso pandêmico dos últimos três anos.
No momento em que chega aos 77 anos, número que tem em si a marca dupla da completude da perfeição do sete, Flávia de Queiroz Lima tem em seu percurso os seguintes livros:
Círculo de Giz, lançado em 1983 (Belo Horizonte, Editora Vigília, 88p., em edição autoral, com ilustrações de Ferruccio Verdolin Filho e planejamento gráfico de Max de Figueiredo Portes), com 37 poemas;
Arrumar as Gavetas, lançado em 2012 (Belo Horizonte, edição autoral, 112p., ilustrado com fotos de esculturas de Pedro Miranda, e fotos de José Luiz Pederneiras e Osias Baptista Neto; o planejamento gráfico é de Ângela Bello, Samira Motta e Derval Braga), com 36 poemas; os poemas estão divididos em seis “gavetas”, antecedidas por dois poemas isolados; contém CD com leituras dos poemas e, abrindo as “gavetas”, trilhas sonoras (participação de Egberto Gismonti, Geraldo Carneiro, José Miguel Wisnick, André Galastro e Flávia de Queiroz Lima, em produção de André Galastro); a última capa contém comentário de Bartolomeu Campos de Queirós;
Sobre Viver, lançado em 2019 (Belo Horizonte, Editora Caravana, em edição autoral de 94p., fotos de Adriana Junqueira de Queiroz Lima e Vera Godoy e planejamento gráfico de Derval Braga), com 38 poemas; os poemas estão divididos em cinco “momentos”; o livro contém apresentação do Prof. Antônio Sérgio Bueno e a última capa é assinada por Yeda Prates Bernis.
Os três livros reúnem 111 poemas – três livros, 111 poemas, uma vida, que agora agrega uma nova obra, no exato instante que Flávia de Queiroz Lima completa os 50 anos em que se radicou em Minas Gerais:
Laços e Avessos (Campinas, SP, Edições Dionysius / Pangeia Editorial, cerca de 80p., ilustrações de Leonora Weissmann, planejamento editorial de Leo Passos, diagramação e acompanhamento de Derval Braga, impressão Gráfica Formato), com 30 poemas, divididos em 4 partes ou “olhares”: Enigmas e Horizontes, Assombros e Labirintos, Cortinas Abertas, Afetos e Afagos.
Para apresentarmos essa poesia, iniciamos com alguns dados biográficos:
Flávia de Queiroz Lima nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 15 de janeiro de 1946.
Estudou piano no Conservatório Brasileiro de Música. Formou-se em Sociologia e Política na PUC/RJ e é pós-graduada em Gestão Pública pela Fundação João Pinheiro – FJP/MG. Ainda no Rio, na década de 60, participou do intenso movimento da música popular brasileira, de festivais da canção, do “Musicanossa”, no Teatro Santa Rosa, compondo, sozinha ou em parcerias, e escrevendo uma coluna diária em um jornal carioca. Também são dessa época os primeiros poemas – entre os quais “Vigília”, uma referência à estátua do Cristo Redentor, que via de sua janela.
Mudou-se para Belo Horizonte em 1972, onde passou a conciliar os trabalhos de socióloga e consultora organizacional, com a poesia e a música, tendo sido gestora na área da saúde pública.
Seus três livros publicados evidenciam forte interação com diferentes culturas e áreas do conhecimento, com parcerias múltiplas, acolhendo em seus livros a pintura, a música, o desenho, a foto, a escultura, a ilustração, e, também, amplitude e variedade de temas e linguagens.
No momento, atua na gestão de projetos da Academia Mineira de Letras.
Ao lançar Círculo de Giz, em 1983, Flavia de Queiroz Lima estava em Belo Horizonte já há onze anos – e, embora sua trajetória nos meios intelectuais cariocas, além da formação acadêmica, remontem à adolescência, Minas Gerais, que a recebeu com “um grande abraço de montanha e gente” (cf. depoimento que consta na última capa do livro), já a tornara no mínimo uma carioca-mineira, e o intimismo das geraes estava – desde sempre e para sempre – em seu ethos e em seu estro.
Exemplifiquemos com a primeira estrofe do poema que encerra o volume e dá título ao livro (p. 81):
Havia um círculo de giz, incerto e tênue,
delineado na poeira dos meus medos,
que me envolvia como um arco de concreto
e antepunha um precipício aos meus desejos.
A estrofe acolhe um período frasal que se alonga em quatro versos intimistas, confessionais, que faz com que o medo atávico, primordial, vindo da poeira dos tempos, se afigure um arco de concreto, um abismo intransponível à realização, por parte do eu lírico, de seus desejos. O paradoxo é que tal círculo de giz é também incerto, tênue – ou seja, é uma projeção mental, ou uma internalização violenta do interdito, que confrange o eu de tal modo que a aparente fragilidade inicial se torna um impeditivo absoluto.
A cadência do verso alexandrino de doze sílabas poéticas, sem enjambements forçados, sem inversões sintáticas, em palavras de uso cotidiano, conduz a leitura de modo fluido, de compreensão imediata, ainda que a seleção lexical e a utilização das palavras aponte a polissemia e densidade de significados próprias da manifestação poética.
É um poema noturno sem ser soturno, é um poema que fecha o espaço no entorno do eu lírico sem que seja claustrofóbico, é um poema intimista sem ser um poema de pulsão da dor, é uma dor que escorre lentamente, quase a medo de se dizer, de se confessar, de se expor.
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Flávia, ainda que carioca, talvez, desde o seu Rio de Janeiro natal, já seria uma poeta com características que a faziam uma mineira nata.
Sim, há algum eco do lirismo de tom épico de uma Cecília Meireles (nasc.: 7 de novembro de 1901, Rio Comprido, RJ, falecimento: 9 de novembro de 1964, Rio de Janeiro, RJ), mas há também os murmúrios da voz de uma Henriqueta Lisboa (nasc.: 15 de julho de 1901, Lambari, MG, falecimento: 9 de outubro de 1985, Belo Horizonte, MG), ou de um Dante Milano (nasc.: 16 de junho de 1899, Rio de Janeiro, RJ, falecimento: 15 de abril de 1991, Petrópolis, RJ), ou ainda de uma Adélia Prado (nasc.: Divinópolis, MG, em 13 de dezembro de 1935), ou um Alphonsus de Guimarães (nasc.: 24 de julho de 1870, Ouro Preto, MG, falecimento: 15 de julho de 1921, Mariana, MG).
Na seara internacional, uma Florbela Espanca (Portugal, 1894-1930) e, claro, Bertold Brecht (Alemanha, 1898-1956).
Se a ligação com a dorida poesia de Florbela, mas também uma poesia de êxtase, de conquista, com laivos de sensual erotismo, parecerá natural, a evocação de Brecht não parece óbvia, para além do título de uma das mais conhecidas peças do dramaturgo alemão: O Círculo de Giz Caucasiano (1944). Vemos tal aproximação, porém, no forte engajamento da poesia de Flávia de Queiroz Lima com o seu (e nosso) hic et nunc, com o movimento histórico subjacente à manifestação lírica, com o referente cultural, social e feminino em que navegam os seus versos.
Podemos conferir esses aspectos nas demais cinco estrofes de “Círculo de giz”, todas elas com quatro versos, todas em versos brancos em que a melopeia se dá em assonâncias e ecos toantes que amalgamam sonoridade e sentidos – a naturalidade dessas escolhas mostra um domínio maduro da expressão poética já no livro de estreia.
Eis a última estrofe do poema (p. 82):
Havia um círculo de giz, hoje é fumaça
tão lentamente se esgarçando, diluindo
e bem no centro dessa esfera esfacelada
eu me revejo, me refaço, me ilumino.
O verbo haver, no mesmo tempo verbal, o pretérito imperfeito que indica durabilidade e até certa infinitude do ser-estar, abre a estrofe inicial e a estrofe final, indiciando um paralelismo entre os dois momentos; isso parece indicar que a ruptura já está instaurada na situação dada, e que na sequência em novo estágio o momento inicial permanece, seja em cicatriz, seja em memória, no registro poético, seja na lembrança do eu lírico.
Na construção, o mesmo alexandrino de doze versos, o mesmo léxico sem palavras raras ou inusuais, a mesma potência na escolha lexical; por outro lado, se a sintaxe se mantém sóbria, os versos se interligam, com o cavalgamento modalizando significados. Assim, à placidez inicial, temos agora as marcas significativas do rompimento sendo configuradas na aporia dos versos que necessitam de complemento para gerarem seus significados e seus novos sentidos.
Os gerúndios do segundo verso carregam, para o interior da estrofe, a permanência do círculo de fumaça que, antes de desaparecer, ainda está no eu lírico que se revê, se refaz e, com o poema, se ilumina.
O segundo livro de Flávia de Queiroz Lima mostra outros aspectos da fabulação poética da escritora.
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“É do espanto diante das possibilidades reflexivas de cada elemento do mundo, que o poeta ergue sua poesia”, preceitua na última capa de Arrumar as Gavetas o poeta e escritor Bartolomeu Campos de Queirós, que complementa: “Com surpreendente acuidade a poeta [Flávia de Queiroz Lima] adentra, sem medo, no mundo das coisas e acaricia o universo com precisos versos, lapidando com muitas faces o mais inerte dos elementos”.
As seis gavetas do livro são as seguintes: Feminino; Natureza; Traços urbanos; Arte; Angola; Achados e perdidos. Como preâmbulo, dois poemas, “Talismã” e “Sonho e segredo”. A cada “gaveta”, a poeta dialoga consigo mesma, passa a vida a limpo, presentifica manuscritos em que se encontra em outros tempos, sopra a poeira do passado, separa “o inútil do que ainda faz sentido”, se reinventa, e, em especial, “Vencida a data / sobra toda a validade / do novo prazo que me espera a cada dia” (“Arrumar as gavetas”, poema que encerra o livro, p. 106-107).
Um escaninho secreto que perpassa todas as gavetas é a reflexão metapoética, que surge já no poema de abertura do livro. Em “Talismã”, a poesia se volta aos “recantos / amarelados no tempo” para contar segredos, sem deles desfazer o encantamento e o mistério; a poesia vem da infância e reconstrói o eu lírico a partir de “fragmentos que se encaixam, / palavras que nos decifram, / metáforas que nos devassam” (p. 11).
O talismã da poeta é, “sem turvar o espelho d’água / onde flutua o desejo”, revisitar em si mesma os “sons da infância” para, a partir deles, se reencontrar na poesia que a recompõe a cada novo dia.
Sobre Viver, o terceiro livro de Flávia de Queiroz Lima, de 2019, já anuncia, desde o título, a dicotomia que o embala, e que antecipa – antena do humano, como nos assegura Ezra Pound, em ABC da literatura – a tumultuosa quadra da qual ainda não saímos, em que o viver se tornou, antes de tudo, o sobreviver diante do minúsculo SARS-CoV-2 e de outros males, covídicos ou não, brasílicos ou mundiais.
No dizer da poeta Yeda Prates Bernis, em texto que está na última capa do livro, “A palavra poética de Flávia […] é poesia para sempre”.
É, ainda, uma poesia de reminiscências, nos assegura na apresentação do livro o Prof. Antônio Sérgio Bueno (p. 8-11).
É, ainda, nos informa o professor, a poesia de um “sujeito poético [que] sabe muito bem que os desejos são o motor da vida”, que constrói uma poesia em que “sensações de novidade, frescor e estranhamento” exercitam o “resistir” diante “da aspereza, da brutalidade e da indiferença” do humano do nosso tempo.
Falamos, antes, que é uma poesia engajada, humanamente engajada, muito distante de qualquer engajamento que pressuponha alinhamento ideológico com estruturas de poder ou governamentais. Os cinco “momentos” – Bordas, Vozes, Memórias, Ciladas e Sobre Viver – nos dizem de uma estética e de uma ética, anunciam uma visão de mundo e estabelecem o universo da poeta.
Em Bordas, há “Estações”, “Tantos ventos”, “Lugares”, “Cais”, “Quando meus olhos viajam”, “Viagens” e “Travessias” – ou seja, as bordas configuram uma geografia que é espacial e que é simbólica, que é mutável, transeunte, e se fixa, tanto com as sensações quanto com o olhar.
Em Vozes, “O Corpo fala”, por “Murmúrios”, em uma “Casa acesa” em seu “Encantamento”, o que gera “Uma cantiga, sempre” e “Um poema ainda possível” – e os títulos dos poemas, já desde o sumário, constroem uma narrativa de tom poético, em que a expressão falada parte do “Corpo”, grafado com inicial maiúscula, passa por enunciação baixa e misteriosa, em casas ancestrais e da memória, espaços encantados geradores de cantigas e de poesia, sendo ainda possível que haja “Um poema”.
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Se em Memórias há “Solidão”, “Herança” e “Partilha”, há outros três poemas até a chegada ao “Esquecimento”, de tal modo que “esse avesso da saudade” busca “o elo perdido, / percorre o mais primitivo / lugar onde o medo invade” (p. 55). O Corpo do eu lírico se torna “cenário oco: / […] que embaça o olhar, amordaça / – dói e pesa como um soco” (p. 54). Trata-se de uma “memória sem dono”, pois a poeta tem em si todas as gentes do humano, e o esquecimento é figurado na menina assombrada, assustada, que tem na estratégia do esquecimento sua defesa para “a lembrança amarga” (p. 54).
Ciladas, o quarto momento (p. 56-73), e Sobre Viver, o quinto momento (p. 74-90), ocupam a metade final do livro. O eu poético se instaura no mundo, um mundo de “Abismo” (p. 63-64) e “Armadilhas” (pp. 67-68) , um mundo em que as asas encontram limites (p. 76) e estão feridas (p. 83), em que a dúvida é permanente entre “Voar ou lançar raízes” (p. 81.82).
Há um movimento do eu para o mundo, do mais íntimo desejo que se confronta com a busca do “Essencial” (p. 84), poema construído espacialmente, formando uma trilha estreita na página na qual o eu lírico faz sua travessia, na qual “o corpo, o ego” busca um “mais” cuja “lista alcança / uns tantos metros”. Após a travessia do indivíduo na família, com filhos e netos, após “Sorver canções, / perambular, / vivenciar / o amor, / o sexo”, e outras conquistas pessoais e com os amigos, signo do coletivo, há um sentimento de “falta”, de incompletude, que faz o sujeito poético, o eu poético, na sua voz lírica, afirmar que “A vida faz / querer-se / além”.
É assim, poeta no mundo, poeta diante do mundo, poeta sofrendo no mundo, poeta que quer o “além” do mundo neste mundo, que Flávia de Queiroz Lima chega ao seu novo livro, que sai agora na Dionysius, o selo de literatura da Pangeia Editorial.
Em Laços e Avessos, as constantes da poesia de Flávia de Queiroz Lima aparecem em novas, surpreendentes e impactantes claves, tanto poéticas quanto linguísticas, tanto temáticas quanto de cosmovisão. Além disso, …
Ah!, leitora amiga, leitor querido, ficaram curiosos, né?
Em breve, em novo artigo, me debruço sobre o novo livro de Flávia de Queiroz Lima.
Até já, então.
* Rauer é professor de literatura brasileira na UFMS
Conheça seus livros na Pangeia, AQUI!
Então, vamos combinar: em breve vocês terão informações detalhadas sobre o Laços e Avessos, de Flávia de Queiroz Lima – nos acompanhe aqui no Blog da Pangeia e em nossas redes sociais (confira abaixo), receba as informações sobre esse espetacular livro de poemas, pois ele logo logo estará na plataforma de pré-vendas da Dionysius, da Pangeia e da Saruê, a Gondwana.
Para já sentirem um pouquinho do gosto do livro, eis uma estrofe de um dos poemas:
no Instagram:
@EDICOES.DIONYSIUS
@PANGEIAEDITORA
@HAIKAI.BRASIL
@AIRA.MAIGER
@ROSANINA.RUBRA
@CLAUDIA_CINEMA_LIVRO
@EU.PROFESSOR.PANGEIA
@EDICOES.SARUE
@_RAUER
Miradouro da Lua, em Luanda, Angola.O poema “Sentinelas
de Pedra”, do livro Arrumar as Gavetas, nasceu lá
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