Um poema de Flávia de Queiroz Lima: “Sentinelas de pedra”

Fechando o mês de janeiro, apresentamos um poema de Flávia de Queiroz Lima, do livro que a poeta lançou em 2012, Arrumar as gavetas. O poema se refere à paisagem de Angola que ilustra esta publicação e trata do tema da escravização dos africanos.

SENTINELAS DE PEDRA

Do Miradouro da Lua
vê-se mais que o sol poente.

Lá do alto se pressente
que o vento deu forma às sombras
e a multidão de fantasmas
talhada em sulcos na terra
foi gente arrancada, às levas
em ferros que já não sente.

O tempo não desassombra
o clamor petrificado.

Escravos levados negros
são vultos brancos, dourados,
emparedados na terra
que ansiaram ver de novo.

São guerreiros perfilados,
são rostos desfigurados
em temporais e naufrágios,
retornados a seu porto.

Agora velam as bordas,
agora choram por dentro
quase reconciliados:
o mar, os antepassados,
o silêncio, o verde, o vento.

Flávia de Queiroz Lima
Quinta gaveta: Angola
Arrumar as Gavetas
2012

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Miradouro da Lua, em Angola
O Miradouro da Lua é uma falésia de frente para o Atlântico, em
Angola, por onde eram levados os escravizados

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