novembro 10, 2020
Em Brazil 2020 latejam força e fúria. É um livro de contos pungentes, escritos com crítica refinada e inteligente. Reúne narrativas que refletem o país tomado pelo medo e pela disrupção. Um país sufocado por milhares de mortes, pela violência política, pela violência urbana e pela violência no trânsito. Um país asfixiado pelo autoritarismo socialmente disseminado e pela desertificação de seus biomas. Um país atordoado pela saudade dos parentes que se foram e pelo horror diante da pandemia inclemente.
Brazil 2020 também apresenta trágicas e sombrias histórias de amor, marcadas pela sensualidade, pela vingança, pela solidão e pelo cuidado com os animais.
Alciene Ribeiro e Rauer, autores com dezenas de livros lançados e donos de estilos peculiares, que rompem com o óbvio, testam em Brazil 2020 os limites expressivos da língua e obtém, por meio de instigantes metáforas, efeitos criativos de alta densidade poética. As narrativas se apresentam claras, fluentes, em enredos criativos, de personagens ao mesmo tempo muito conhecidas e completamente estranhas.
Cada conto representa, a seu modo e em seu tom específico, a angústia do nosso tempo, sentimento que entranha de modo crescente as fábulas, até o clímax surpreendente.
As narrativas do livro desvelam um país doente, necrosado, temática que se expressa de modo vigoroso, em linguagem ao mesmo tempo coloquial e diferenciada, pouco convencional.
Os contos são plasmados com humanismo, ainda que alguns deles sejam encenados por figuras grotescas, inquietantemente abjetas, asquerosas ao último grau da miséria moral e física. Esse humanismo que conduz a escrita de Alciene Ribeiro e de Rauer salva da sátira o universo que as páginas de Brazil 2020 desvela.