A professora Nima Spigolon, da Faculdade de Educação da Unicamp, que tem diversos livros publicados na Editora Pangeia, nas Edições Dionysius e no selo infantojuvenil Edições Saruê, da qual é curadora, concedeu entrevista à jornalista Naira Zitel, do Jornal Correio Popular. A entrevista foi publicada na edição do dia 4 de fevereiro, e a reproduzimos abaixo.
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https://www.fe.unicamp.br/, em 06/02/23
O analfabetismo afeta a população mais vulnerável de Campinas. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 15,1 mil moradores da metrópole são considerados analfabetos absolutos, o que representa 1,72% da população. Para reverter essa situação, cada vez mais pessoas buscam instituições de Educação de Jovens Adultos (EJA) como o caso de Odila da Silva, de 71 anos.
Ela conta que não teve oportunidade de estudar, pois nasceu em Governador Valadares (MG) e os pais precisavam de sua ajuda para colocar dinheiro em casa. “Eu morava na roça e, naquele tempo, era preciso trabalhar desde muito cedo e a escola era muito longe também”, diz.
Com 17 anos, Odila se mudou para Campinas, mas precisava continuar garantindo o próprio sustento. “Eu trabalhava a semana inteirinha e ficava até 18h, 19h na horta, então, não tinha como parar para estudar”, relata.
Depois que os filhos e os netos cresceram, aos 69 anos, ela resolveu entrar em uma escola EJA. “Agora que eu estou sozinha vou ver se aprendo alguma coisa”, comentou. Odila diz que a idade dificulta o aprendizado, mas que entende a importância de saber ler e escrever nas atividades do dia a dia. Ela incentivou os filhos e os netos a estudarem para terem “uma vida diferente”.
A história de Ademir Saco, de 48 anos, é semelhante à de Odila. Ele precisou trabalhar desde cedo e, por isso, não teve acesso à educação básica. Atualmente, trabalha como segurança e decidiu estudar no ano passado.
“Eu estudo de manhã e trabalho à noite. Tomei essa decisão para ver se consigo um emprego melhor, registrado, com mais benefícios para poder cuidar da minha família”, comenta o campineiro que tem um filho de dois anos para criar.
Com poucos meses de aula, Ademir já sente a diferença que os estudos podem proporcionar, no entanto, ressalta as dificuldades. “Eu não tive oportunidade antes e agora estou pagando o preço”, pontua.
Ascensão social
Educação é a porta de entrada para a ascensão social, por isso, a professora da Unicamp, líder do grupo de pesquisas e estudos em educação de jovens e adultos (GEPEJA), Nima Spigolon, ressalta a importância da alfabetização. “É preciso lutar em defesa de políticas públicas que criem condições para a supressão do analfabetismo adulto e a emancipação dos sujeitos, tendo em vista a construção de sociedades dignas, amorosas e com justiça social”, diz.
Ela pontua que ensinar a ler e a escrever está além do entendimento das palavras. “Alfabetização com jovens, adultos e idosos expressa a capacidade humana de refletir sobre o mundo, sobre a posição que ocupa no mundo e a vontade de transformar a sociedade”, reflete a professora.
Ao ser questionada sobre a porcentagem de analfabetos absolutos em Campinas, Nima afirma que é inadmissível que uma cidade tenha analfabetos. “Enquanto houver um analfabeto adulto, jovem e idoso há exclusão social e um cenário desumano”, completa. Ela ainda lembra que a educação é um direito de todos e dever do Estado.
A líder do GEPEJA explica que a população analfabeta não está relacionada somente à escassez de recursos destinados a ela. Essa situação também está vinculada à vulnerabilidade, a violência, a questões de gênero, raça, cor e classe social.
“Ninguém é analfabeto porque quer, e sim porque faz parte das condições de lugar onde vive e do acesso, permanência e cobertura das políticas públicas, do direito básico e universal à educação, o direito de ler e escrever”, conclui Spigolon.
A especialista sintetiza que “a manutenção do analfabetismo é a expressão da miséria de um povo e seu governo, é um projeto político originário na desigualdade social com objetivos econômicos e sociais, consequência inevitável da ganância do capitalismo e da coisificação neoliberal”.
Como solução para a questão do analfabetismo, Nima propõe a efetivação de uma educação básica, pública e popular, de qualidade, gratuita, laica, universal, de forma que todas as pessoas se inscrevam. Além disso, ela diz que é preciso alavancar as políticas públicas relacionadas à EJA.
“Eu tenho esperança, do verbo esperançar de Paulo Freire, que um dia teremos todas as pessoas alfabetizadas, e por isso afirmo que um outro mundo é possível intermediado pela educação”, finaliza a professora.
Fevereiro Violeta
Neste mês, a prefeitura de Campinas, por meio da Fundação Municipal de Desenvolvimento Comunitário (Fumec), promove a 10ª edição da Campanha Fevereiro Violeta. A ação tem como objetivo erradicar o analfabetismo na metrópole.
“Lembrando que a cor violeta tem três significados: dignidade, prosperidade e respeito. A gente trabalha nessa linha para fortalecer a campanha”, explica José Batista, gerente dos programas de EJA na Fumec.
Batista explica que a campanha acontece em fevereiro, “porque é o início do ano e é preciso começar com o pé direito, fazendo o processo de conscientização da sociedade sobre a causa”. Ele aponta que, muitas vezes, a pessoa que não sabe ler e escrever se sente constrangida em buscar ajuda, por isso, é fundamental que familiares e amigos entendam do assunto e saibam como ajudar de uma forma respeitosa.
“Se nós (FUMEC) ficarmos sozinhos fazendo esse trabalho mesmo com recursos, a comunicação depende que cada pessoa exerça seu papel de cidadão para que o recado chegue para quem realmente precisa. Não tem jeito, é preciso essa mobilização”, completa o gerente dos programas de EJA.
Publicação original:
https://correio.rac.com.br/campinasermc/analfabetismo-absoluto-atinge-15-1-mil-pessoas-em-campinas-1.1339111
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