Uma entrevista com Nima Spigolon sobre dois de seus livros de poesia

Neste Dia do Professor publicamos entrevista realizada neste mês de outubro com a Profa. Nima Spigolon – para abordar a face da poeta, ou melhor: as faces. Pois Nima lança no momento dois livros de poesia, um com candentes poemas existenciais, de feição contemporânea, e outro de poemas haikais, que medita sobre a humanidade, sobre o feminino a partir da lição milenar da conformação do haiku.

Chumbo Sutil tem produção da aldeia de eleição de Nima, a Ituiutaba de sua primeira infância, de sua adolescência, da sua formação profissional e dos primeiros anos profissionais, pois reúne ituiutabanos nas diversas etapas da construção do livro: Rauer é o Editor, Ciberpajé é o capista e Rizera é o diagramador; além disso, o ensaio de apresentação é do premiado ficcionista Whisner Fraga e o “Prefácio Pessoal” é da jovem poeta Aira Maiger.

Já Umematsuri é um pequeno livro no formato, mas é um livro imenso sob diversos aspectos: na intertextualidade antropofágica, na metaforização da dor, na escrevivência do feminino ancestral diante da misoginia e do patriarcado, nas epifanias do cotidiano.

Rauer conduziu essa entrevista para o Blog da Pangeia – e nela a poeta e haijin Nima Spigolon fala de literatura e poesia, do ato de escrever e sobre escrita feminina, de seu cânone pessoal no universo do haikai, em particular de um paideuma composto por haijins mulheres, dos primórdios do waka, a forma poética que deu origem ao haikai, a poetas mais recentes, incluindo uma contemporânea.

Nima trata também da gênese dos dois livros, Chumbo Sutil e Umematsuri, e discorre sobre suas diversificadas dicções poéticas.

Rauer – Há, a seu ver, uma literatura que pode ser caracterizada como escrita feminina?

Nima – A literatura escrita por mulheres difere, sim, da escrita por homens: por um lado, as marcas da experiência e das visões de mundo e de sociedade de quem escreve e, por outro, há a problematização da especificidade e registro de marcas do feminino no discurso e na escrita de nós mulheres. Cito Virgínia Woolf, no livro Um teto todo seu, no qual ela discute a necessidade de as mulheres escritoras conquistarem seu espaço, tanto literal quanto metafórico, dentro de um universo dominado por homens. Considero importante mencionar que a literatura de autoria feminina brasileira, vinculada aos movimentos feministas, iniciados ainda no século XIX, quiça antes, significa uma espécie de subversão aos estereótipos tradicionais, como forma de resistência ao patriarcado e de luta contra a misoginia.

Como lê hoje essas haijins que desde os primórdios do dos waka, estão na constituição do haikai e do tanka clássicos no Japão?

Leio com deleite e busco inspiração, pois as reconheço em um lugar feminino, milenar, da poesia japonesa. Elas influenciam até hoje a constituição do haikai e do tanka. Tais haijins, ao captarem um instante contemplativo, demonstram a característica dos haicais tradicionais, e atualmente faço uma releitura que me permite aventurar em formas mais livres, onde a reflexão sobre a liberdade e a sobrevivência é apresentada com grande carga simbólica.

De que modo vê a apropriação no Brasil do haikai, na linha dos grandes poetas que o constituíram, na linhagem que vem de Bashô até Shiki?

Vejo como a capacidade de brincar com a linguagem e ao mesmo tempo manter a essência do haikai ao revelar o domínio técnico e a liberdade criativa. Considero imprescindível conhecer profundamente as regras e a tradição do haikai ao estilo japonês, o que nos permite emular essa poesia em nossa índole e cenário, mas também nos possibilita transgredir as normas. Nesse movimento, os haikaístas brasileiros nos oferecem preciosas criações poéticas.

Temos grandes poetas mulheres, grandes haijins da escrita femininas – nos fale um pouco das poeta que a marcaram de modo especial.

Procuro fazer uma aclimatação temática e formal seguindo os preceitos da tradição do haiku – e assim busco me inspirar nas fontes femininas antigas: na imperatriz Jitô  Tennô, na libertária Ukon, na prolífica Izumi Shikibu, na impressionante Murasaki Shikibu, para mencionar apenas algumas das pioneiras. Entre as mais recentes, muito me impactam os poemas de Chiyo-Ni, Tskeshita Shizunojo, Sujita Hisajo e Takajo Mitsuhashi. E preciso destacar a obra imensa, inspiradora, seminal de Teruko Oda,

Nos conte um pouco, por favor, da gênese desse Umematsuri.

Esse livro nasceu do desafio diário que me impus de escrever haikais. A forma e a visão de mundo do haikai exigem um olhar apurado no processo da escrita e em especial da revisão textual. Ao mesmo tempo, é um poema que oferece ao leitor um espaço amplo para a interpretação pessoal e mesmo uma espécie de reconstrução de significados. Deixei fluir minha sensibilidade e deixei pulsar minha alma e criatividade. Há, em Umematsuri, haikais que se alternam entre estilos que respeitam as normas clássicas japonesas e outros mais livres, nos quais permiti que minhas subjetividades flutuassem na escrita; espero que com naturalidade.

Seus dois livros de poesia mais recentes são muito diferentes entre si. Chumbo Sutil tem registros que retomam os modernismos do século XX; já este Umematsuri reúne poemas que dialogam com a longa tradição oriental, bebendo ainda na lírica ocidental e as amalgamando. Fale-nos um pouco sobre isso, por favor.

Tenho observado em mim um exercício de amadurecimento literário, identificado no conjunto de minhas publicações ao longo do tempo. Ambos os livros dialogam, livre e visivelmente, com esse exercício. Enquanto Chumbo Sutil vincula-se às angústias da contemporaneidade com pinceladas fortes de concretude, Umematsuri reflete o poema nipônico tradicional em interface aos trópicos brasileiros. A mim mesma é interessante identificar as multifaces da escritora que faz zigue-zagues desde a polifonia dissonante de contemplar a paz da natureza ancestral até a voz que trata do universo urbano e das sociedades humanas atuais, cada vez mais cruéis.

Para dialogar com nima, nos escreva na Pangeia, no email
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